Fernando Alcoforado*
Recentemente a Prefeitura de Salvador anunciou que pretende elaborar um plano para zerar a emissão de carbono até 2049. Apesar de aplaudir esta iniciativa da Prefeitura de Salvador, é preciso reconhecer que se trata de uma contradição pretender zerar a emissão de carbono até 2049 e ao mesmo tempo estar executando o projeto BRT que, além de devastar extensa área com a derrubada de centenas de árvores que atuariam como sumidouro de carbono, utilizar ônibus que queimam combustíveis fósseis e implantar inúmeros viadutos que incentivam o uso de automóveis que queimam combustíveis fósseis e aquecem o ar do ambiente em que circulam.
Para zerar a emissão de carbono, a Prefeitura deveria ter contemplado no PDDU- Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano a adoção de estratégias que possibilitassem transformar Salvador em cidade sustentável. Não basta fazer um plano para zerar a emissão de carbono. É preciso tornar Salvador uma cidade sustentável. Em 23/10/2017, publicamos no website Academia.edu o artigo Como tornar as cidades sustentáveis. Neste artigo afirmamos que “Uma cidade sustentável deve ter políticas claras e abrangentes para saneamento, coleta e tratamento de lixo; gestão da água, com coleta, tratamento, economia e reuso; sistemas de transporte que privilegiem o transporte de massas com qualidade e segurança; ações que preservem e ampliem áreas verdes e uso de energias limpas e renováveis; e, sobretudo, administração pública transparente e compartilhada com a sociedade civil organizada”. A Prefeitura de Salvador deixa a desejar na adoção dessas medidas que transformariam Salvador em cidade sustentável.
Nossa opinião sobre o PDDU proposto pela Prefeitura de Salvador está contida no Relatório sobre o Projeto de Lei do PDDU e Salvador sob a responsabilidade de Débora Nunes e Ordep Serra com base em anotações da 1ª Oficina de Reflexões Propositivas sobre a lei do PDDU, promovida pelo Ministério Público, no dia 20 janeiro de 2016, no Auditório do MP em Nazaré que informa na parte referente ao desenvolvimento econômico de Salvador o seguinte:
“O perito Fernando Alcoforado, economista de grande experiência na abordagem da problemática soteropolitana, indicou falhas metodológicas básicas no documento em tela, incidentes no campo da articulação entre economia e planejamento urbano, visto como o projeto em apreço não trabalha com cenários vindouros, limitando-se a tratar Salvador como uma caixa fechada, sem articulação metropolitana, regional, nacional e internacional. As deficiências do diagnóstico apresentado chegam a ser escandalosas. Como apontou ainda o Dr. Alcoforado, nos estudos apresentados não há consideração de variáveis exógenas, apenas endógenas: demografia, taxa de desemprego e produtividade do trabalho. Não foram levadas em consideração mudanças tecnológicas, nem ambientais. Sequer a inexorável elevação do nível dos mares foi advertida, numa cidade litorânea” (grifo nosso).
Em 03/01/2018, publicamos no website Academia.edu o artigo As grandes fragilidades do PDDU- Plano de Desenvolvimento Urbano de Salvador no qual destacamos que “O PDDU de Salvador apresenta grandes fragilidades pelo fato de não oferecer respostas consistentes no que concerne à: 1) promoção do desenvolvimento econômico da cidade; 2) racionalização do caótico sistema de mobilidade urbana; e, 3) sustentabilidade urbana incluindo sua adaptação à mudança climática global (grifos nossos).
Em 19/03/2018, publicamos no website Academia.edu o artigo As fragilidades na sustentabilidade urbana de Salvador no qual afirmamos que “Na época atual em que os problemas do aquecimento global podem levar à catástrofe planetária, toda cidade tem que ter um plano de adaptação às mudanças climáticas, principalmente aquelas afetas a eventos extremos. Cidades costeiras como Salvador, por exemplo, devem ter planejamento contra a elevação previsível do nível dos oceanos, devem se preocupar com deslizamentos em encostas, enchentes, etc. resultantes da inclemência das chuvas. Enfim, devem ter flexibilidade e adaptabilidade às novas exigências climáticas (grifo nosso). É preciso redesenhar o crescimento urbano de Salvador de forma a integrá-la com o ambiente natural, recuperar suas praias e seus rios hoje bastante comprometidos com o lançamento de esgotos, para que a cidade não receba uma resposta hostil do ambiente natural”.
Pode-se afirmar que a Prefeitura só terá condições de zerar a emissão de carbono até 2049 se tornar Salvador uma cidade sustentável contemplando, entre outras medidas, o abandono do projeto BRT que utiliza combustíveis fósseis substituindo-o por outro projeto que contemple o uso de eletricidade como, por exemplo, o VLT e o ônibus elétrico e realizar o transporte de massa de alta capacidade com a expansão do metrô para reduzir a circulação de automóveis na cidade.
* Fernando Alcoforado, 80, condecorado com a Medalha do Mérito da Engenharia do Sistema CONFEA/CREA, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015), As Grandes Revoluções Científicas, Econômicas e Sociais que Mudaram o Mundo (Editora CRV, Curitiba, 2016), A Invenção de um novo Brasil (Editora CRV, Curitiba, 2017), Esquerda x Direita e a sua convergência (Associação Baiana de Imprensa, Salvador, 2018, em co-autoria) e Como inventar o futuro para mudar o mundo (Editora CRV, Curitiba, 2019).