Fernando Alcoforado*
Este artigo visa demonstrar que existe solução para evitar o colapso da economia brasileira em consequência do novo Coronavirus e como retomar o crescimento econômico do Brasil após a propagação do virus. Este artigo mostra, também, porque o governo Bolsonaro não adota as estratégias propostas neste artigo que se explica pelo fato de seu ministro da economia não ser suficientemente competente para fazer frente à maior crise econômica da história do Brasil e por ser um fundamentalista do neoliberalismo por não admitir a intervenção do governo na economia.
O Produto Interno Bruto (PIB) de um país é calculado com base na soma de todos os seus componentes: PIB = C + I + G + X – M. Nesta fórmula, C corresponde à despesa das famílias em bens de consumo (consumo privado), I corresponde à despesa das empresas em investimento, quer em bens de capital, quer em estoques de matérias-primas e produtos, G corresponde à despesa do governo (governos federal, estaduais e municipais) em bens de consumo (consumo público), X corresponde à receita com exportações e M ao gasto com importações.
Baseado nesta fórmula, pode-se afirmar que o crescimento do PIB só poderá ser realizado com a expansão do consumo privado (C), o aumento do investimento na atividade produtiva (I), a elevação da despesa do Estado (G), o aumento da receita de exportação (X) e a redução dos gastos com importações (M).
Nas condições atuais de crise do novo Coronavirus no Brasil, ocorre queda no consumo privado (C) e no investimento das empresas na atividade produtiva (I) devido à queda vertiginosa no consumo privado (C). As receitas de exportações (X) se mantém crescendo graças ao desempenho do agronegócio e o gasto com importações é decrescente devido à queda no investimento das empresas (I).
De acordo com o modelo econômico proposto pelo Lord Keynes, se há queda no consumo privado (C), do investimento das empresas na atividade produtiva (I) e na receita de exportações (X), o governo deve aumentar seu gasto (G) e reduzir os gastos com importações (M) para evitar a queda do crescimento econômico para manter a estabilidade econômica de um país. Cabe observar que o modelo econômico Keynesiano de estabilização da economia considera que o governo deve intervir para combater recessões e depressões econômicas como a de 1929 compensando com o gasto público (G) a queda no consumo das famílias (C), do investimento das empresas (I) e na receita de exportações (X).
O modelo Keynesiano foi adotado pelo governo do presidente Roosevelt nos Estados Unidos após a depressão de 1929 que permitiu recuperar sua economia e, também, em todos os países do mundo após a 2ª Guerra Mundial quando foi substituído em 1990 pelo modelo econômico neoliberal que admite a intervenção do governo na economia apenas em caráter excepcional. O modelo econômico neoliberal passou a ser dominante em todo em todo o mundo a partir de 1990 sendo responsável pela crise mundial de 2008 que só foi atenuada graças às intervenções dos governos em todos os países do mundo.
A elevação do gasto do governo (G) é crucial para combater a recessão e fazer a economia brasileira crescer. Enquanto perdurar a crise do novo Coronavirus, o governo federal deveria elevar seu gasto (G) com a distribuição de renda básica para as populações vulneráveis e desempregados, com a criação de linha de crédito a juros baixos para evitar a falência das empresas, especialmente das micro, pequena e média empresas, bem como com o incentivo fiscal e financeiro ao desenvolvimento do comércio eletrônico.
Esta elevação do gasto do governo (G) colaboraria no sentido de minimizar a queda no consumo das famílias (C) e manter as empresas em operação da qual resultaria em menor demissão de trabalhadores evitando, desta forma, o comprometimento do consumo das famílias. Com o aumento do gasto do governo (G), o governo federal estaria colaborando no sentido de minimizar a queda do PIB que se prevê será de 8% em 2020, segundo o Banco Mundial. O governo federal poderá alavancar ainda mais o consumo das famílias (C) se adotar uma política de crédito a juros atrativos que incentive o consumidor a comprar.
Enquanto ocorre a ajuda do governo federal às empresas com a criação de linha de crédito a juros baixos, especialmente para as micro, pequena e média empresas, as empresas em geral precisam se reinventar com a adoção do comércio eletrônico e com a prestação de serviços fora de suas instalações. Ao adotar este procedimento, as empresas incentivariam o consumo das famílias (C) e de outras empresas demandantes de seus serviços, além de contribuirem para a elevação do investimento privado (I).
Estas são, portanto, as estratégias capazes de evitar o colapso da economia brasileira durante a pandemia do novo Coronavirus. Para financiar as ações do governo federal, pode-se usar as reservas internacionais do País no montante de US$ 320 bilhões. Mas, para retomar o crescimento econômico do Brasil após a pandemia do novo Coronavirus, o governo federal deve atuar como se fosse uma locomotiva realizando gasto (G) capaz de impulsionar o aumento do consumo das famílias (C), do investimento das empresas (I) e das receitas de exportações (X) e a redução do gasto com importações (M).
O governo deve elevar seu gasto (G) com a realização de investimentos maciços em infra-estrutura econômica (energia, transporte e comunicações) e infraestrutura social (educação, saúde, habitação e saneamento básico) que demandam recuros da ordem de R$ 2 trilhões. O governo federal atuaria, desta forma, como indutor da retomada do crescimento econômico do Brasil com a realização desses investimentos.
Esta ação do governo com um amplo programa de obras públicas de infraestrutura (energia, transporte, habitação, saneamento básico, etc.) com a participação do setor privado contribuiria para combater o atual desemprego em massa elevando os níveis de emprego e da renda das famílias e das empresas para, em consequência, promover a expansão do consumo das famílias e das empresas resultantes, respectivamente, do aumento da massa salarial das famílias e da renda das empresas. Esta ação do governo contribuiria para elevar o consumo das famílias (C) com o aumento da massa salarial da população e do investimento das empresas (I).
Para elevar o nível dos investimentos do setor privado (I), é preciso que o governo implemente uma política de incentivos fiscais e juros atrativos para os empresários. O crescimento econômico pode ser alcançado também com a elevação do nível das exportações (X) mesmo diante de um cenário pouco favorável de crescimento do comércio internacional e, também, com a redução das importações (I) com a política de substituição de bens importados visando a expansão das atividades econômicas internas. É importante observar que a produção interna de bens importados contribuiria, não apenas para aumentar o PIB, mas também para gerar empregos contribuindo, desta forma, para combater o gigantesco desemprego existente no Brasil.
Sobre a política de substituição de bens importados, a crise do novo Coronavirus revela a importância da autossuficiência nacional. A decisão dos governos em várias partes do mundo, inclusive do Brasil, desde 1990, de não produzir localmente transferindo-a para locais onde as margens de lucro seriam maiores foi determinante da decisão dos governos de não investirem na produção de materiais e equipamentos médicos em seus países transferindo-a para os países de menor custo de produção como é o caso da China. O resultado é catastrófico porque há falta de insumos para fabricação de fármacos, respiradores e, até mesmo, máscaras para proteção de profissionais da saúde e da população neste momento de enfrentamento do novo Coronavirus.
No Brasil, a situação é lastimável porque a indústria, a ciência e a tecnologia nacional foram sucateadas desde 1990 com a adoção pelos diversos governos de políticas neoliberais que contribuíram para aumentar a dependência tecnológica e industrial em relação ao exterior. A retração atual da indústria brasileira revela incapacidade de reação do setor e a perspectiva de reversão do quadro é muito difícil na conjuntura atual de recessão econômica agravada pela crise do novo Coronavirus. Esta retração da indústria brasileira vem desde a década de 1980, quando a participação da indústria de transformação no Produto Interno Bruto (PIB) era de 33% e, em 2019, não passou de 11,3%. É o patamar mais baixo em 80 anos. Estagnada, a indústria tem a menor fatia do PIB desde o final da década de 1940.
Pelo exposto, pode-se concluir que países como o Brasil devem perseguir sua autossuficiência abandonando a política atual, neoliberal e de globalização econômica e financeira, responsável por suas fragilidades econômicas e pela dependência em relação ao exterior, com sua substituição pelo modelo de desenvolvimento que priorize a produção no interior do país dos produtos e serviços essenciais para seu progresso econômico e social. Só assim será possível fazer o Brasil crescer economicamente a taxas elevadas e eliminar a subutilização da força de trabalho que atinge o nível recorde de 27,7 milhões de trabalhadores, segundo a pesquisa PNAD do IBGE.
Diferentemente do que estamos propondo para minimizar os efeitos do novo Coronavirus sobre a economia brasileira e retomar seu crescimento econômico, o governo Bolsonaro se mantém inerte, nada fazendo para impedir os efeitos devastadores do novo Coronavirus sobre o consumo das famílias e o investimento das empresas. Esta inércia do governo Bolsonaro deve ser debitada ao incompetente ministro da Economia, Paulo Guedes, que não conseguiu reativar a economia brasileira em estagnação desde 2015 e, também, não sabe como fazer frente à debacle econômica e social do Brasil em consequência do novo Coronavirus.
Desde que assumiu o ministério da Economia do governo Bolsonaro, Paulo Guedes, fundamentalista neoliberal, elaborou a reforma da Previdência Social e o programa de privatizações de empresas estatais que, em seu entendimento, seriam capazes de reativar a economia brasileira. Nada disto aconteceu. A economia brasileira continua estagnada com pífias taxas de crescimento econômico e que, segundo o Banco Mundial, deve ter uma queda de 8% no PIB em 2020.
Além de ser incompetente na condução da economia brasileira, Paulo Guedes colaborou com o governo Bolsonaro ao transformar a nação brasileira em um país subalterno aos interesses dos Estados Unidos e do capital internacional. Este alinhamento subalterno aos interesses norte-americanos e do capital internacional se manifesta com a entrega da Base de Alcântara aos Estados Unidos, com a desnacionalização da Embraer com sua venda à Boeing, ao fazer gigantesco leilão de petróleo na área do pre-sal realizando a maior entrega de riquezas nacionais da história ao capital estrangeiro com a área excedente da “cessão onerosa” da Petrobras da ordem de 30 bilhões de barris nos campos gigantes e com o esquartejamento da Petrobras para enfraquecê-la visando sua privatização.
Paulo Guedes afirmou que pretende privatizar todo o patrimônio público entregando-o, em consequência, ao capital estrangeiro. Privatizar implica, na verdade, no que se costuma chamar de “desnacionalização”, em que os adquirentes controladores são quase sempre (se não sempre!) empresas ou consórcios estrangeiros cujos lucros são remetidos para suas matrizes no exterior. O uso do termo “privatização” é uma maneira de esconder sua verdadeira finalidade que é a de entregar o patrimônio da nação ao capital estrangeiro. Além de incompetente na gestão da economia brasileira, Paulo Guedes atua como lacaio dos interesses do capital estrangeiro no Brasil. Enquanto Paulo Guedes continuar no comando do ministério da Economia e Bolsonaro na presidência da República, não superaremos os gigantescos problemas econômicos atuais e futuro do Brasil.
* Fernando Alcoforado, 80, condecorado com a Medalha do Mérito da Engenharia do Sistema CONFEA/CREA, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015), As Grandes Revoluções Científicas, Econômicas e Sociais que Mudaram o Mundo (Editora CRV, Curitiba, 2016), A Invenção de um novo Brasil (Editora CRV, Curitiba, 2017), Esquerda x Direita e a sua convergência (Associação Baiana de Imprensa, Salvador, 2018, em co-autoria) e Como inventar o futuro para mudar o mundo (Editora CRV, Curitiba, 2019).