O FRACASSO DO BRASIL NA CONSTRUÇÃO DE SEU PROGRESSO POLÍTICO, ECONÔMICO E SOCIAL AO LONGO DA HISTÓRIA

Fernando Alcoforado*

Este artigo apresenta os fatores que contribuíram para o fracasso do Brasil para alcançar elevados níveis de desenvolvimento político, econômico e social ao longo de sua história.  Este fracasso ocorreu no período colonial (1500 a 1821) e durante o Império (1822 a 1889) e a República (após 1889) comprometendo seu desenvolvimento político, econômico e social. O latifúndio implantado durante o período colonial ainda permanece no Brasil. O esforço de industrialização do País foi comprometido com a internacionalização da economia brasileira a partir de 1955 e a adoção do neoliberalismo a partir de 1990. O Brasil que era dependente de Portugal passou a ter sua dependência em relação à Inglaterra e, depois, pela dos Estados Unidos, do sistema financeiro internacional e dos capitais externos. A economia brasileira teve um avanço célere na desnacionalização com a crescente penetração do capital estrangeiro e foram agravados os problemas sociais da nação brasileira na era contemporânea.

O Brasil no período colonial (1500 a 1821)

De 1500 a 1821, no período colonial, o Brasil centrou sua atividade econômica na produção de produtos primários para exportação. Foi este processo que consolidou, no Brasil Colônia, o latifúndio, isto é, a grande propriedade rural, a monocultura de exportação, a escravidão, a vinculação dependente do país em relação ao exterior e suas lamentáveis consequências. No Brasil, prosperou a colônia de exploração de Portugal ao invés da colônia de povoamento como a que ocorreu nos Estados Unidos caracterizada pela existência da pequena e média propriedade dedicada ao autoconsumo e /ou ao mercado interno. Pode-se afirmar que a implantação de uma colônia de exploração ao invés de uma colônia de povoamento foi um dos fatores que contribuiu para o atraso econômico do Brasil ao longo de sua história.  Para manter o Brasil atrasado economicamente e culturalmente, durante o período colonial, Portugal evitou implantar universidades no País que só ocorreu tardiamente, no século XVIII, além de ter feito a abertura dos portos em 1808 que favoreceu os interesses da Grã-Bretanha aprofundando sua dependência em relação ao exterior.

O Brasil durante o Império (1822 a 1889)

A Independência do Brasil em 1822 foi uma falsa independência porque continuou subordinado a Portugal, além de ter sido uma “independência sem revolução” porque não houve mudanças na base econômica da nação. O Estado que nasce da Independência do Brasil mantém o execrável latifúndio e intensifica a não menos execrável escravidão fazendo desta o suporte da restauração que realiza quanto às estruturas econômicas herdadas da Colônia. Além disso, o Brasil pagou pesada indenização aos cofres portugueses pelo fato de Portugal ter concedido a Independência do Brasil. A Independência do Brasil diferiu da experiência dos demais países das Américas porque não apresentou as características de um típico processo revolucionário nacional-libertador. O nativismo revolucionário, sob a influência dos ideais do liberalismo e das grandes revoluções de fins do século XVIII cedeu terreno no Brasil à lógica de mudar conservando os privilégios que prevalece até hoje.  O principal fato deplorável da Independência do Brasil é o de que ela não resultou da luta do povo brasileiro, mas sim da vontade do Imperador D. Pedro I.  Lamentavelmente, a Independência do Brasil não levou à abolição da escravidão que beneficiaria o principal segmento social que habitava o país, os africanos escravizados.

D. Pedro I autorizou enormes gastos com a Guerra da Cisplatina que ocorreu de 1825 a 1828, entre Brasil e Argentina, pela posse da Província de Cisplatina, atual Uruguai.  O dinheiro gasto nos combates desequilibrou bastante a economia brasileira, já desfalcada com o pagamento a Portugal pelo reconhecimento da Independência do Brasil. O desfecho desfavorável ao Brasil com a Guerra da Cisplatina que desejava que o Uruguai continuasse integrado ao Império do Brasil agravou a crise política no País e foi um motivo a mais para a insatisfação dos brasileiros em relação ao Imperador D. Pedro I que abdicou ao trono em 7 de abril de 1831 depois do assassinato do jornalista Libero Badaró, grande crítico do Império do Brasil, que fez com que ficasse precária a sustentação política do Imperador. A saída de D. Pedro I do governo imperial representou uma nova fase para a história política brasileira. Não tendo idade para assumir o trono, seu filho, D. Pedro II, deveria aguardar sua maioridade para tornar-se imperador. Para solucionar este problema, para governar o Brasil foi eleita uma Regência Provisória e posteriormente, uma Regência Trina Permanente. Tinha início um conturbado período, em que a unidade territorial do País e a autoridade central foram questionadas e postas à prova por motins, revoltas e rebeliões em todo o Brasil. No ano de 1840, com apenas quinze anos de idade, Dom Pedro II foi coroado Imperador do Brasil. Deste momento em diante, ele passaria a ser a mais importante figura política do País por praticamente cinco décadas. 

Durante o Império, o Brasil se envolveu em guerra contra o Paraguai que foi o maior conflito armado internacional ocorrido entre os anos de 1864 e 1870 na América do Sul.  O Brasil, a Argentina e o Uruguai firmaram o acordo militar chamado de Tríplice Aliança que derrotou o Paraguai e dizimou metade de sua população. Com relação ao Brasil, a guerra custou milhares de vidas (60 mil) e afetou bastante a economia, sendo necessário tomar vários empréstimos da Inglaterra para manter o equilíbrio financeiro do país. A Inglaterra não participou diretamente da guerra, mas foi o único país a lucrar com ela, porque ampliou seus mercados e o Brasil aumentou sua dívida com o Reino Unido. Alcançando seu auge entre 1850 e 1870, o regime imperial entrou em declínio posteriormente com o desenrolar de vários eventos como o fim do tráfico negreiro e do escravismo e as contendas com militares e religiosos que abalaram a monarquia. O primeiro golpe contundente contra D. Pedro II aconteceu no ano de 1888, quando a princesa Isabel autorizou a libertação de todos os escravos por imposição britânica. A partir daí, o governo perdeu o apoio dos escravocratas, último pilar que sustentava a existência do poder imperial. No ano seguinte, o acirramento nas relações entre o Exército e o Império foi suficiente para que um golpe militar derrubasse a Monarquia e proclamasse a República no Brasil.

O Brasil durante a República Velha (1889 a 1929)

O principal fato deplorável da Proclamação da República é o de que ela não resultou da luta do povo brasileiro e sim de um golpe de estado patrocinado pelo Exército com o apoio das oligarquias econômicas que dominavam o Brasil. Repetiu-se com a Proclamação da República o que ocorreu com a Independência do Brasil que não resultou da luta do povo brasileiro, mas sim da vontade do Imperador D. Pedro I. A República que nasce do golpe de estado mantém o modelo econômico agrário-exportador que privilegia os interesses das oligarquias desde 1500 com o execrável latifúndio herdado do período colonial. Deplorável, também, foi a manutenção da subordinação do País em relação à Inglaterra desde 1810.

A República Velha, ou Primeira República, é o nome dado ao período compreendido entre a Proclamação da República, em 1889, e o seu fim com a eclosão da Revolução de 1930. A República Velha teve dois momentos: a República da Espada e a República Oligárquica. A República da Espada abrange os governos dos marechais Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto. Foi durante a República da Espada que foi outorgada a Constituição que iria nortear as ações institucionais durante a República Velha. Este período foi marcado por crises econômicas, como a do Encilhamento, e por conflitos como a Revolução Federalista e a Revolta da Armada. A República Oligárquica foi marcada pelo controle político exercido sobre o governo federal pela oligarquia cafeeira paulista e pela elite rural mineira, na conhecida “política do café com leite”. Foi nesse período ainda que se desenvolveu mais fortemente o coronelismo, garantindo poder político regional às diversas elites locais do País. Durante este período houve vários conflitos sociais como a Guerra de Canudos, a Revolta da Vacina, a Revolta da Chibata, a Guerra do Contestado, o Tenentismo, a Coluna Prestes e o Cangaço. Este período marca também a ascensão e queda do poder econômico dos fazendeiros paulistas baseada na produção do café para a exportação. Na República Velha foi mantida, também, a subordinação do País em relação à Inglaterra que ocorreu desde o Império a partir de 1810.

O modelo econômico agrário-exportador, que foi adotado do período colonial a partir de 1500 até 1930, tinha como principais interessados na sua manutenção a classe de latifundiários e setores agroexportadores. A crise econômica mundial que atingiu profundamente a produção cafeeira em 1929 foi um dos fatores que levaram à queda da República Velha que foi nefasta para o Brasil porque manteve o modelo agrário-exportador que se estruturou com base no latifúndio desde 1500. Deplorável, também, foi o exercício do poder de forma pseudodemocrática pelas oligarquias que dominavam o Brasil que contribuiu para a eclosão da crise política resultante da eleição fraudulenta do sucessor do então presidente Washington Luís que foi outro fator que redundou na denominada Revolução de 30 e na ascensão ao poder de Getúlio Vargas.

O Brasil durante a Era Vargas (1930 a 1945)

Quando Getúlio Vargas ascende ao poder, inicia o período de industrialização no Brasil. O modelo econômico nacional desenvolvimentista adotado pelo governo Vargas promoveu o desenvolvimento do Brasil com a política de substituição de importações apoiada, fundamentalmente, em investimentos governamentais, especialmente em infraestrutura, em investimentos de empresas estatais e investimentos de capitais privados nacionais.  Vargas baseou sua administração nos preceitos do populismo, nacionalismo e trabalhismo. A política econômica passou a valorizar o mercado interno que favorecia o crescimento industrial e, consequentemente, o processo de urbanização. A modernização do Brasil encetada pelo governo Vargas não levou, entretanto, à realização de mudanças na estrutura agrária que continuou dominada pelo latifúndio. A Era Vargas marca, portanto, a mudança dos rumos da República, com o poder político do País sendo compartilhado entre os grandes proprietários de terra e empresários industriais.

Getúlio Vargas, que governou o Brasil de 1930 a 1945, instituiu a ditadura do Estado Novo em 1937 após a eclosão do movimento revolucionário promovido pelos comunistas em 1935 que foi esmagado pelo governo federal. À medida que se tornava claro o fim da Segunda Guerra Mundial em 1945, crescia a rejeição ao governo de Getúlio Vargas que se viu forçado por pressões de forças políticas democráticas a conceder anistia para os presos políticos, a permitir a liberdade de organização partidária, convocar uma nova Assembleia Nacional Constituinte e marcar novas eleições. No dia 29 de outubro de 1945, por pressão do governo dos Estados Unidos, militares invadiram a sede do governo, o Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, e forçaram a renúncia do presidente Vargas. Consolidava-se, assim, a queda do Estado Novo. A deposição de Vargas ocorreu não apenas porque a ditadura do Estado Novo era incompatível com os novos tempos de democratização do mundo após a 2ª Guerra Mundial, mas também, para atrelar o Brasil aos interesses dos Estados Unidos que aconteceu a partir do governo do general Eurico Gaspar Dutra.

O Brasil durante a República democrática (1946 a 1964)

Após a deposição de Getúlio Vargas, o general Eurico Dutra foi o primeiro presidente eleito pelo voto direto. Internamente, teve como primeira grande ação, a convocação da Assembleia Nacional Constituinte que elaborou as leis a serem integradas a uma nova Carta Magna. Oficializada em 1946, a nova Constituição brasileira determinava a autonomia entre os três poderes e a realização de eleições diretas para os cargos executivos e legislativos estaduais, municipais e federais. Na economia, as reservas cambiais do país foram diminuindo, a indústria nacional desacelerou e a dívida externa voltou a crescer tornando o País cada vez mais vulnerável economicamente. O presidente Dutra que governou o Brasil de 1946 a 1950 vivenciou as tensões e problemas que marcaram o desenvolvimento da Guerra Fria no cenário político internacional após a 2ª Guerra Mundial. O governo Dutra não deu continuidade ao projeto nacionalista de Getúlio Vargas e tornou o Brasil subalterno aos Estados Unidos com a aliança que fez com o governo norte-americano, fato este que repercutiu em ações políticas de natureza autoritária no plano interno. Por imposição dos Estados Unidos, o Partido Comunista, após receber uma significativa quantidade de votos nas eleições de 1946, foi posto na ilegalidade e todos os funcionários públicos pertencentes ao mesmo partido foram exonerados de seus cargos. Pouco tempo depois, o governo do Brasil anunciou o rompimento de suas relações diplomáticas com a União Soviética.

Getúlio Vargas voltou a governar o Brasil de 1951 a 1954 quando foi realizado um esforço de planejamento muito mais ambicioso e completo do que no período anterior com a adoção de uma política econômica nacional desenvolvimentista. Nessa oportunidade, houve um dos mais completos levantamentos sobre a economia brasileira, além de propor uma série de projetos de infraestrutura com seus programas de execução, abrangendo projetos de modernização de vias férreas, portos, navegação de cabotagem, geração de energia elétrica, etc. Foram adotadas medidas para superar as disparidades regionais de renda, sobretudo para melhor integrar o Nordeste ao restante da economia nacional e para alcançar a estabilidade monetária. Foram criados, também, o BNDES e a Petrobras.  Acusado de tentar assassinar Carlos Lacerda e da morte do major Rubens Vaz, o presidente Vargas suicidou-se por não aceitar sua deposição pelos militares em 1954, tendo sua atitude representada, também, o ato final do primeiro de um governante do Brasil que pautou sua ação em defesa do progresso econômico e social do País e da soberania nacional. Apesar dos êxitos econômicos ao promover a industrialização do Brasil e ao criar instituições governamentais promotoras do desenvolvimento econômico e social e dos avanços sociais resultantes de novas legislações, a Era Vargas, de 1930 a 1945 e de 1951 a 1954, teve como fato deplorável o representado pelo estado de exceção que foi implantado de 1937 a 1945 em que o governo Vargas prendeu nos seus cárceres e assassinou muitos de seus opositores.

Juscelino Kubitschek governou o Brasil de 1955 a 1960. A industrialização brasileira toma novo rumo. Até então, durante o governo Vargas, o processo de industrialização avançara sob a liderança da empresa brasileira. A partir do governo Juscelino Kubitscheck, o capital estrangeiro vai assumir, progressivamente, o controle dos ramos mais dinâmicos da economia brasileira. A expansão da economia brasileira se fez com crescente participação do capital estrangeiro oligopolizado que realizou seus investimentos visando a completa conquista do mercado nacional. A partir do governo Kubitschek, é aprofundada a desnacionalização da economia nacional com o capital estrangeiro assumindo o comando do processo de industrialização do Brasil e a indústria nacional ficando relegada a sua própria sorte ao sofrer a concorrência dos grupos externos atraídos pelos incentivos e vantagens oficiais. Jânio Quadros substitui Juscelino Kubitscheck em 1961 e renuncia após governar o Brasil durante 7 meses.

O Vice-presidente João Goulart assumiu a Presidência da República em 3 de setembro de 1961 em regime parlamentarista sob a direção de Tancredo Neves que foi a solução política encontrada diante da luta de Leonel Brizola em defesa da legalidade para assegurar a posse de João Goulart e da oposição das Forças Armadas à sua posse. Depois de colocar um fim no parlamentarismo através de plebiscito, João Goulart buscou implementar as reformas de base para superar os grandes problemas estruturais vividos pelo Brasil e para fazer frente à crise econômica, política e social existente nos primeiros anos da década de 1960. Com as reformas de base foram adotadas iniciativas que visavam as reformas bancária, fiscal, urbana, administrativa, agrária e universitária. Incluía também oferecer o direito de voto para analfabetos e às patentes subalternas das Forças Armadas. As medidas buscavam também uma participação maior do Estado brasileiro nas questões econômicas, regulando o investimento estrangeiro no Brasil. Entre as mudanças pretendidas pelas reformas de base estava, em primeiro lugar, a reforma agrária. O objetivo era possibilitar que milhares de trabalhadores rurais tivessem acesso às terras em mãos do latifúndio. A lei de remessa de lucros buscava reduzir o altíssimo índice de lucros que as grandes empresas estrangeiras remetiam do Brasil para suas matrizes. As reformas de base objetivavam o progresso econômico e social e a defesa dos interesses nacionais. O governo João Goulart foi o último na história do Brasil que buscou promover o progresso econômico e social e a defesa dos interesses nacionais.

A investida do governo João Goulart pela aplicação das reformas de base começou no dia 13 de março de 1964 através de um grande comício na Central do Brasil no Rio de Janeiro. Neste comício, o presidente João Goulart anunciou a assinatura do decreto que estatizava refinarias de petróleo particulares e o decreto que desapropriava terras improdutivas localizadas à beira de estradas e ferrovias. Como as propostas tinham um cunho nacionalista e eram influenciadas pelo pensamento de esquerda, os defensores do capitalismo, do latifúndio e membros da direita brasileira receavam quanto ao crescimento de um possível governo comunista no país. O comício na Central do Brasil foi o momento decisivo para determinar a organização dos militares para dar início ao golpe de estado que foi deflagrado em 31 de março de 1964 estabelecendo uma ditadura militar no país para abortar as mudanças econômicas e sociais patrocinadas pelo governo João Goulart. As Forças Armadas agiram para derrubar o governo Goulart influenciadas pela polarização ideológica vivenciada pela sociedade brasileira naquela conjuntura política e, também, devido à quebra da hierarquia e da disciplina com a sublevação de setores subalternos que foi o principal fator que ocasionou o afastamento dos militares legalistas que deixaram de apoiar o governo de João Goulart, facilitando o movimento golpista.

O Brasil durante a ditadura militar (1964 a 1985)

Com a deposição de João Goulart do poder, foram promulgados atos institucionais durante os governos dos generais Castello Branco (1964-1967) e Artur da Costa e Silva (1967-1969) que acabaram com o Estado de direito e as instituições democráticas do País. Para conter as manifestações de oposição, o general Costa e Silva decretou em dezembro de 1968, o Ato Institucional nº 5 que suspendeu as atividades do Congresso e autorizava à perseguição de opositores. De 1968 a 1973, o Brasil experimentou elevadas taxas de crescimento econômico, gerando um clima de otimismo logo batizado como “o milagre econômico” e a indústria se constituiu no principal setor no surto de desenvolvimento iniciado em 1968. Durante a ditadura militar, houve a implementação de 3 PNDs — Plano Nacional de Desenvolvimento nos governos Garrastazu Médici, Ernesto Geisel e João Figueiredo. Foi, sobretudo, no governo Ernesto Geisel, com o II PND, que foram definidos como objetivos completar a estrutura industrial brasileira, substituir importações de insumos básicos e bens de capital, superar os problemas cambiais resultantes da crise do petróleo, desenvolver projetos de carvão, não ferrosos, álcool da cana, energia elétrica e petróleo implantados na década de 1970 em várias partes do país e contribuir para a desconcentração da atividade produtiva no Brasil.  O modelo de desenvolvimento capitalista dependente a partir do governo Juscelino Kubitschek em 1955 foi mantido até 1985 pelos governantes militares que assumiram o poder com o golpe de estado em 1964.

A recessão e a elevação do desemprego do início e do fim da década de 1980 assumiram uma dimensão até então desconhecida. A característica da economia brasileira que mais se evidencia é a de que a queda acentuada no ritmo de crescimento indicou o esgotamento de um padrão que lhe conferiu impressionante dinamismo ao longo de todo o período da moderna industrialização, particularmente depois de meados da década de 1950. Com a economia claudicante, o retorno de alguns exilados que se incumbiam de fazer o relato das barbaridades testemunhadas ou vividas nos porões da ditadura, e a campanha pró-anistia ganhando as ruas, a sociedade brasileira foi vencendo a luta pela democracia. Os espaços de luta pelo fim da presença dos militares no poder central foram se multiplicando. Nos últimos meses de 1983, teve início em todo o País uma campanha pelas eleições diretas para presidente, as “Diretas Já”, que uniram várias lideranças políticas. O movimento chegou ao auge em 1984, quando foi votada a Emenda Dante de Oliveira, que pretendia restabelecer as eleições diretas para presidente. No dia 25 de abril, a emenda apesar de obter a maioria dos votos, não conseguiu os 2/3 necessários para sua aprovação. Logo depois da derrota de 25 de abril, grande parte das forças de oposição resolveu participar das eleições indiretas para presidente. O PMDB lançou Tancredo Neves para presidente e José Sarney para vice-presidente. Reunido o Colégio Eleitoral, a maioria dos votos foi para Tancredo Neves, que derrotou Paulo Maluf do PDS, candidato da ditadura militar. Desse modo se encerrava a ditadura militar. Tancredo Neves faleceu antes de assumir o governo, fato este que fez com que o Vice-presidente José Sarney ocupasse a Presidência da República.

É oportuno observar que, de 1980 a 1989, no período dos governos João Figueiredo e José Sarney, ocorreu uma profunda deterioração da situação econômica e social do Brasil. Na década de 1980, o Brasil apresentou déficit no balanço de pagamentos que se agravou com o segundo “choque do petróleo” e a subida vertiginosa das taxas de juros no mercado internacional. O modelo de desenvolvimento baseado no processo de substituição de importações e dependente de tecnologia e capitais externos, que atingiu o auge na década de 1970, se esgotou no início dos anos 1980. As décadas de 1980 e de 1990 marcam a mais longa e grave crise do Brasil em sua história só superada pela crise econômica atual eclodida em 2014 que foi agravada pela pandemia do novo Coronavirus. Com o fim da ditadura militar, houve a necessidade de elaboração de uma nova Constituição. A Assembleia Nacional Constituinte começou a se reunir em fevereiro de 1987 e só teve suas atividades encerradas em setembro de 1988. Além dos deputados federais e senadores, havia também a presença dos “notáveis”, isto é, especialistas em diversos assuntos que diziam respeito à cidadania, à educação, à jurisprudência, ou seja, a todos os assuntos correlacionados ao edifício jurídico de uma Constituição Federal. A nova Constituição foi promulgada em 05 de outubro de 1988 e permanece até hoje como lei fundamental do Brasil, isto é, é nela que se apoia todo o ordenamento jurídico brasileiro.

O Brasil durante a nova República (a partir de 1988)

Fernando Collor de Mello foi o primeiro presidente do Brasil eleito diretamente pelo voto popular após o fim do Regime Militar em 1985 e a promulgação da Constituição de 1988. Seu governo teve de enfrentar uma forte crise financeira, que exigia medidas drásticas. As saídas oferecidas por sua equipe de economistas, como os planos Collor I e Collor II, mostraram-se desastrosas, provocando uma forte rejeição popular. Não bastasse isso, o tesoureiro da campanha presidencial de Collor, Paulo César (PC) Fariaspassou a ser acusado de estar envolvido em um escândalo de corrupção. Essa suspeita acabou por envolver a figura do presidente no escândalo, fato que custou não apenas o seu cargo, mas também os seus direitos políticos.

Adotando de forma subalterna a estratégia de ajuste neoliberal formulada pelo Consenso de Washington, o governo de Itamar Franco, que substituiu Fernando Collor, e o governo Fernando Henrique Cardoso (FHC), que substituiu o governo Itamar Franco, começaram a cumprir suas três etapas descritas abaixo: 1) estabilização da economia (combate à inflação); 2) realização de reformas estruturais (privatizações, desregulamentação de mercados, liberalização financeira e comercial), e 3) retomada dos investimentos estrangeiros para alavancar o desenvolvimento. Os governos Itamar Franco e FHC processaram o combate à inflação com o Plano Real, privatizou empresas estatais e abriu ainda mais a economia nacional ao capital internacional. O governo Lula manteve a mesma política de seu antecessor FHC, à exceção da política de privatização. O governo Dilma Rousseff deu continuidade aos governos de FHC e de Lula que lhe antecederam retomando a política de privatização que teve a denominação de parceria público-privada.

O modelo econômico neoliberal adotado no Brasil trouxe como consequência a recessão econômica que teve seu início em 2014, a falência generalizada de empresas, o desemprego em massa que atingiu 13 milhões de trabalhadores, a subutilização de 27 milhões de trabalhadores, a desindustrialização do País e o aumento da desnacionalização do que ainda resta do patrimônio público no Brasil e, consequentemente, em maior subordinação do País em relação ao exterior. A crise econômica recessiva associada à corrupção sistêmica que estava presente em vários órgãos do governo federal fez com que Dilma Rousseff, que foi presidente da República Federativa do Brasil de janeiro de 2011 a agosto de 2016 (reeleita nas eleições de 2014), sofresse a rejeição das classes economicamente dominantes, de grande parte da população e da maioria do Congresso Nacional e sofresse um processo de impeachment que se realizou com um golpe parlamentar que resultou em sua destituição do cargo.

O governo Michel Temer, que substituiu o de Dilma Rousseff, agravou ainda mais a situação econômica e social do Brasil adotando medidas que aprofundaram a recessão e inviabilizaram a retomada do desenvolvimento do Brasil. Os resultados estão aí: crescimento econômico negativo, desequilíbrios externos, desindustrialização do País, estagnação da produtividade, falência generalizada de empresas, desemprego em massa, dívida interna elevada, crise fiscal dos governos federal, estaduais e municipais e, agora também retrocesso no campo das conquistas sociais com a adoção da reforma trabalhista. Com o governo Jair Bolsonaro a partir de 2019, o futuro do Brasil está ameaçado ainda mais porque ele está radicalizando ainda mais na adoção do modelo neoliberal cujas consequências serão funestas para os direitos sociais, o meio ambiente e à independência do Brasil em relação às grandes potências e ao capital internacional. Na época em que vivemos com o governo Jair Bolsonaro não há espaço para o avanço da democracia, dos direitos sociais, da defesa do meio ambiente e da independência nacional. Ao contrário, há a tentativa de eliminação da democracia e dos direitos sociais e a desconstrução e negação das conquistas já realizadas pelas classes subalternas e pela nação brasileira para alcançar sua emancipação.

Conclusões

Pelo exposto, fica evidenciado que os problemas enfrentados pelo Brasil no momento e não resolvidos resultam de fatores que se somaram e acumularam ao longo de sua história de 520 anos, isto é, no período colonial e durante o Império e a República. O fracasso do Brasil na construção do progresso político, econômico e social ao longo de sua história fez com que o País se defrontasse com os problemas atuais que foram criados e perduram desde o período colonial cujas tentativas de superação foram abortadas pela repressão contra os movimentos sociais, pela derrubada de governos comprometidos com o progresso econômico e social do País e a defesa dos interesses nacionais, bem como com a adoção de políticas governamentais antinacionais e antissociais. O Brasil só alcançará o efetivo progresso econômico e social quando realizar uma reforma agrária que extirpe o secular latifúndio existente no País, quando implantar o Estado de Bem-Estar Social que assegure o pleno atendimento das necessidades básicas da população em termos de emprego, educação, saúde, transporte, habitação, saneamento básico e lazer, quando eliminar o divórcio entre o Estado e a Sociedade Civil assegurando a participação democrática do povo nas decisões do governo em todos os níveis através de plebiscito e referendo e quando o governo priorizar os interesses da grande maioria da população e garantir a soberania nacional.

* Fernando Alcoforado, 80, condecorado com a Medalha do Mérito da Engenharia do Sistema CONFEA/CREA, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015), As Grandes Revoluções Científicas, Econômicas e Sociais que Mudaram o Mundo (Editora CRV, Curitiba, 2016), A Invenção de um novo Brasil (Editora CRV, Curitiba, 2017),  Esquerda x Direita e a sua convergência (Associação Baiana de Imprensa, Salvador, 2018, em co-autoria) e Como inventar o futuro para mudar o mundo (Editora CRV, Curitiba, 2019).

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Author: falcoforado

FERNANDO ANTONIO GONÇALVES ALCOFORADO, condecorado com a Medalha do Mérito da Engenharia do Sistema CONFEA/CREA, membro da Academia Baiana de Educação, da SBPC- Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e do IPB- Instituto Politécnico da Bahia, engenheiro pela Escola Politécnica da UFBA e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário (Engenharia, Economia e Administração) e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, foi Assessor do Vice-Presidente de Engenharia e Tecnologia da LIGHT S.A. Electric power distribution company do Rio de Janeiro, Coordenador de Planejamento Estratégico do CEPED- Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da Bahia, Subsecretário de Energia do Estado da Bahia, Secretário do Planejamento de Salvador, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015), As Grandes Revoluções Científicas, Econômicas e Sociais que Mudaram o Mundo (Editora CRV, Curitiba, 2016), A Invenção de um novo Brasil (Editora CRV, Curitiba, 2017), Esquerda x Direita e a sua convergência (Associação Baiana de Imprensa, Salvador, 2018, em co-autoria), Como inventar o futuro para mudar o mundo (Editora CRV, Curitiba, 2019), A humanidade ameaçada e as estratégias para sua sobrevivência (Editora Dialética, São Paulo, 2021), A escalada da ciência e da tecnologia ao longo da história e sua contribuição ao progresso e à sobrevivência da humanidade (Editora CRV, Curitiba, 2022), de capítulo do livro Flood Handbook (CRC Press, Boca Raton, Florida, United States, 2022), How to protect human beings from threats to their existence and avoid the extinction of humanity (Generis Publishing, Europe, Republic of Moldova, Chișinău, 2023) e A revolução da educação necessária ao Brasil na era contemporânea (Editora CRV, Curitiba, 2023).

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