Fernando Alcoforado*
Hoje, 5 de junho, é celebrado o Dia Mundial do Meio Ambiente instituído desde 1972 durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, em Estocolmo. Essa data, que foi escolhida para coincidir com a realização dessa conferência, tem como objetivo principal chamar a atenção de todas as esferas da população mundial para os problemas ambientais e para a importância da preservação dos recursos naturais, que até então eram considerados, por muitos, inesgotáveis. Nessa Conferência, que ficou conhecida como Conferência de Estocolmo, iniciou-se uma mudança no modo de ver e tratar as questões ambientais ao redor do mundo, além de serem estabelecidos princípios para orientar a política ambiental em todo o planeta. Apesar do grande avanço que representou a Conferência de Estocolmo, não se pode comemorar esta data devido à degradação do meio ambiente em todo o planeta que se registra e a ameaça da mudança climática que pode ocorrer até meados do século XXI e colocar em risco a própria sobrevivência da humanidade.
A degradação do meio ambiente em todo o planeta resulta do fato de a Terra enfrentar a maior taxa de extinção desde os dinossauros há mais de 60 milhões de anos graças às ações predatórias promovidas desde a 1ª Revolução Industrial no século XVII até o presente momento. Desmatamento, sobretudo no Brasil, agricultura insustentável, poluição e uso de pesticidas são algumas das causas humanas da diminuição da biodiversidade em todo o mundo. Desde 1970,40% dos animais marinhos desapareceram e as populações de insetos em alguns lugares do mundo e de animais de água doce diminuíram 75%. Estima-se que os seres humanos tenham impactado negativamente 83% da superfície terrestre, desde ecossistemas a espécies de animais. Na era em que vivemos, a humanidade se defronta, também, com a ameaça representada pelo aquecimento global que tende a produzir mudanças climáticas catastróficas em todo o planeta com graves repercussões sobre as atividades econômicas e o agravamento dos problemas sociais da humanidade.
A degradação do meio ambiente em todo o planeta e a mudança climática catastrófica em todo o planeta tendem a produzir uma verdadeira crise de humanidade que faz com que se torne um imperativo a construção de uma nova sociedade que atue de forma sustentável, interdependente e racional com objetivos comuns em cada país e em escala planetária sem a qual poderá ser colocada em xeque a sobrevivência dos seres humanos e da vida no planeta. Se não agirmos agora no sentido de construirmos uma sociedade sustentável, a extinção dos animais e dos próprios seres humanos pode ser o grande legado da humanidade. A nova sociedade a ser construída teria que ser sustentável do ponto de vista econômico, social e ambiental. A sustentabilidade global requer que a população mundial se estabilize no máximo em oito bilhões de pessoas, as economias sustentáveis não sejam movidas por combustíveis fósseis, mas sim por energia solar e suas muitas formas diretas e indiretas (luz solar para aquecimento e eletricidade fotovoltaica, energia eólica, hidrelétrica e assim por diante), a energia nuclear deixe de ser usada devido a sua longa lista de desvantagens e riscos econômicos, sociais e ambientais, a produção de energia seja mais descentralizada e, por isso mesmo, menos vulnerável aos cortes ou apagões e um sistema energético sustentável muito mais eficiente seja utilizado.
Em uma sociedade sustentável, o sistema de transporte será mais eficiente e menos poluente do que é hoje. As pessoas terão que morar muito mais perto dos seus locais de trabalho e se movimentarão por sistemas altamente desenvolvidos de ônibus e transportes sobre trilhos, haverá menos automóveis particulares, as bicicletas serão um veículo importante no sistema de transporte sustentável, a reciclagem será a principal fonte de matéria prima nas indústrias sustentáveis, e o design de produtos se concentrará na durabilidade e no uso reiterado, em vez da vida curta e descartável dos produtos como ocorre hoje. O desejável será uma mentalidade baseada na ética da reciclagem quando as empresas de reciclagem ocuparão o lugar das atuais companhias de limpeza urbana e disposição final do lixo, reduzindo a quantidade de resíduos em pelo menos em dois terços.
Em uma sociedade sustentável haverá a necessidade de uma base biológica restaurada e estabilizada, o uso da terra terá que seguir os princípios básicos da estabilidade biológica (a retenção de nutrientes, o equilíbrio de carbono, a proteção do solo, a conservação da água e a preservação da diversidade de espécies), as áreas rurais terão maior diversidade do que atualmente com o manejo equilibrado da terra, em que haverá rotatividade de plantações e de cultivo de espécies, não haverá desperdício de colheitas, os bosques tropicais serão conservados, não haverá desmatamento para obtenção de madeira e outros produtos, milhões de hectares de novas árvores serão plantados, os esforços para deter a desertificação transformarão as áreas degradadas em terrenos produtivos, o uso exaustivo de pastagens será eliminado, assim como haverá modificação na cadeia alimentar das sociedades afluentes, para incluir menos carne e mais grãos e vegetais.
Os sistemas de valores atuais que enfatizam a quantidade, a expansão, a competição e a dominação darão lugar à qualidade, à conservação, à cooperação e à solidariedade entre os seres humanos na nova sociedade a ser construída. A característica decisiva de uma economia sustentável será a rejeição da cega busca de crescimento econômico. O produto interno bruto será reconhecido como um indicador falido do progresso econômico e social, as mudanças econômicas e sociais, tanto quanto as tecnológicas, serão medidas por sua contribuição à sustentabilidade, os orçamentos militares serão uma pequena fração do que são hoje ou reduzidos a zero, os governos investirão em uma fortalecida Organização das Nações Unidas, que atuaria como um governo mundial, para a manutenção da paz em vez de manter caras e poluidoras instituições de defesa, as nações descentralizarão o poder e a tomada de decisões dentro de suas próprias fronteiras e, ao mesmo tempo, estabelecerão um grau de cooperação e coordenação sem precedentes em nível internacional para solucionar os problemas globais.
É em defesa da vida no planeta Terra que se torna um imperativo a implantação de uma sociedade sustentável em cada país e no mundo para evitar que seja colocada em xeque a existência dos seres vivos e da própria humanidade. A nova sociedade sustentável na esfera mundial deve ser capaz de regular as relações internacionais baseadas em um Contrato Social Planetário visando promover o desenvolvimento sustentável em benefício de todos os seres humanos. Este Contrato Social Planetário deveria resultar da vontade da Assembleia geral da ONU que se constituiria no novo Parlamento Mundial que elegeria um Governo Mundial representativo da vontade de todos os povos do mundo. Com um Governo Mundial, será possível, não apenas ordenar a economia global, combater a guerra e acabar com o banho de sangue que tem caracterizado a história da humanidade, mas também, evitar o esgotamento dos recursos naturais do planeta e a mudança climática catastrófica que ameaça a vida no planeta. No Dia Mundial do Meio Ambiente, é preciso que a humanidade se conscientize da necessidade de construir uma sociedade sustentável em defesa da vida em nosso planeta.
* Fernando Alcoforado, 81, condecorado com a Medalha do Mérito da Engenharia do Sistema CONFEA/CREA, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015), As Grandes Revoluções Científicas, Econômicas e Sociais que Mudaram o Mundo (Editora CRV, Curitiba, 2016), A Invenção de um novo Brasil (Editora CRV, Curitiba, 2017), Esquerda x Direita e a sua convergência (Associação Baiana de Imprensa, Salvador, 2018, em co-autoria) e Como inventar o futuro para mudar o mundo (Editora CRV, Curitiba, 2019).