COMO SUPERAR A VULNERABILIDADE DO BRASIL COM A ELEVAÇÃO DOS PREÇOS DOS COMBUSTÍVEIS

Fernando Alcoforado*

Este artigo tem por objetivo propor soluções para superar a vulnerabilidade do Brasil com a elevação dos preços dos combustíveis que resultou de erros estratégicos cometidos por diversos governos brasileiros ao longo da história do setor de petróleo no País começando com a quebra do monopólio estatal do petróleo e abertura do capital da Petrobras ao capital privado, especialmente estrangeiro, em 1997 pelo governo Fernando Henrique Cardoso, o desinvestimento dos ativos da Petrobras e o atrelamento da política de preços dos combustíveis no mercado brasileiro ao preço do barril de petróleo no mercado internacional e à variação do dólar em relação ao real, em 2016 pelo governo Michel Temer, e a inexistência de uma política de expansão da capacidade de refino para processar petróleo produzido no Brasil pelos governos Michel Temer e Jair Bolsonaro. Tudo isto contribuiu para tornar o Brasil vulnerável à elevação dos preços do barril de petróleo e de seus derivados no mercado internacional com suas repercussões no mercado interno.    

Em 2021, os preços da gasolina e do diesel subiram mais de 80% em dólares no mercado internacional. Em junho de 2022, o preço do barril de petróleo alcançou US 120 com um aumento de 61%. Este é o preço que a Petrobras vem pagando para importar gasolina e óleo diesel por não ser autossuficiente em refino de derivados de petróleo. O problema atual da elevação dos preços dos combustíveis poderia ter sido evitado no Brasil se o País, que é autossuficiente na produção de petróleo com o pre-sal, possuísse capacidade de refino de derivados de petróleo suficiente para atender a demanda. O Brasil tem 17 refinarias de petróleo com capacidade para processar 2,4 milhões de barris por dia. Treze dessas refinarias pertencem à Petrobras que respondem por 98,2% da capacidade total. Atualmente, a extração de petróleo no Brasil é suficiente para atender à demanda nacional, até porque se produz mais petróleo do que se consome. O problema é que o parque de refino do Brasil ainda não é capaz de refinar grande parte do petróleo produzido no País nem de suprir a demanda interna por outros derivados o que faz com que exporte petróleo e importe derivados de petróleo.  

O Brasil produz 2,9 milhões de barris de petróleo por dia que seria mais do que suficiente para produzir derivados no País para atender seu consumo. No entanto, para dispor de derivados de petróleo, é preciso refiná-lo para transformá-lo em gasolina e diesel, entre outros derivados. Lamentavelmente, o Brasil não tem refinarias com capacidade suficiente para processar o petróleo produzido no país. Este é um dos fatores que fizeram com que o Brasil ficasse dependente do suprimento de derivados de petróleo do mercado internacional. Isto se deve ao fato de as refinarias da Petrobras em operação no país terem sido projetadas para trabalhar com óleo leve, fácil de refinar, oriundo da Arábia Saudita que era a nossa fonte quando éramos grandes importadores de petróleo. Este fato obriga o Brasil a importar gasolina e óleo diesel para atender a demanda cujos preços são determinados no mercado internacional de commodities.  

Cabe observar que boa parte das refinarias brasileiras foi construída na década de 1970, quando o petróleo importado era do tipo leve. Com a descoberta e a extração de petróleo na Bacia de Campos, as refinarias precisaram passar por um processo de adaptação para refinar o petróleo brasileiro, do tipo mais pesado. Com o pré-sal cujo petróleo é extraído em águas profundas e sem maquinário específico nas refinarias existentes para esse tipo de petróleo, ele passou a ser exportado. Diariamente, mais de 1 milhão de barris de petróleo do pré-sal são enviados para o exterior e o Brasil compra do exterior 170 mil barris por dia de derivados do petróleo. O Brasil foi obrigado a importar derivados do petróleo para compor o blend como é chamada a mistura do petróleo brasileiro do tipo pesado com outros tipos que possibilita o refino. Esta é a explicação para o fato de o Brasil ser autossuficiente em produção de petróleo e ter que importar derivados de petróleo.

Esta situação se agravou porque, com a guerra na Ucrânia e as sanções econômicas contra a Rússia, que restringiram a compra de petróleo deste país, segundo maior produtor de petróleo do mundo, houve queda na oferta de petróleo no mercado internacional que fez com que houvesse a subida dos preços do barril de petróleo e de seus derivados e afetassem os preços dos combustíveis no Brasil haja vista que o País é dependente da importação de derivados de petróleo e os preços dos combustíveis no mercado brasileiro estão atrelados ao preço do barril de petróleo no mercado internacional e à variação do dólar em relação ao real. Os efeitos da elevação dos preços dos combustíveis no Brasil têm sido devastadores porque a Petrobras tem elevado os preços de seus derivados continuamente na medida em que ocorre o aumento dos preços do barril de petróleo no mercado internacional.

Para superar a vulnerabilidade do Brasil com a elevação vertiginosa dos preços dos combustíveis e evitar problemas futuros, é preciso eliminar os erros estratégicos cometidos por diversos governos brasileiros ao longo da história do setor de petróleo no País como a quebra do monopólio estatal do petróleo e a abertura do capital da Petrobras ao capital privado, o atrelamento da política de preços dos combustíveis no mercado brasileiro ao preço do barril de petróleo no mercado internacional e à variação do dólar em relação ao real e a inexistência de uma política de expansão da capacidade de refino para processar petróleo produzido no Brasil adotando as estratégias seguintes:

1) A curto prazo, utilizar os dividendos recebidos pela governo federal na constituição de um fundo para financiamento de subsídios às populações de baixa renda usuárias de GLP, aos caminhoneiros usuários de diesel e aos taxistas e motoristas de aplicativos usuários de gasolina e gás natural veicular.

2) A médio e longo prazo, promover a expansão da capacidade de refino do País para processar todo o petróleo produzido no Brasil, cessar o processo de desinvestimento em curso da Petrobras, retomar o efetivo controle acionário da Petrobras pelo governo brasileiro com o aumento de sua participação acionária na empresa, adotar uma política de preços dos combustíveis baseada nos custos efetivos do petróleo e gás natural produzido no Brasil e não no mercado internacional e recuperar o monopólio estatal do petróleo.

Dessas estratégias, as mais importantes são as que contemplam o aumento da participação acionária do governo federal na Petrobras, a adoção da política de preços dos combustíveis baseada nos custos efetivos do petróleo e gás natural produzido no Brasil e não no mercado internacional e a recuperação do monopólio estatal do petróleo da Petrobras. São estas estratégias que possibilitam evitar que o Brasil se defronte no futuro com os problemas que enfrentam atualmente. O aumento da participação acionária do governo federal na Petrobras é fundamental para que o governo brasileiro tenha o controle da empresa. O controle da Petrobras pelo governo federal nunca foi tão baixo sendo hoje com mais de 40% da empresa controlada por estrangeiros. Essa é uma tendência que vem se confirmando desde 2017, graças à decisão do BNDES e de outros órgãos públicos de vender grandes lotes de ações que possuíam. A Petrobras está hoje mais a serviço dos acionistas privados, especialmente estrangeiros, do que do governo brasileiro. Isto explica o fato de a Petrobras não atender os interesses de seu acionista majoritário, o governo brasileiro, e sim os interesses de seus acionistas privados ao privilegiar seus lucros em detrimento dos interesses do Brasil e de sua população como ocorre no momento com a elevação desmesurada dos preços dos combustíveis no País.   

* Fernando Alcoforado, 82, condecorado com a Medalha do Mérito da Engenharia do Sistema CONFEA/CREA, membro da Academia Baiana de Educação, da SBPC- Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e do IPB- Instituto Politécnico da Bahia, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, foi Assessor do Vice-Presidente de Engenharia e Tecnologia da LIGHT S.A. Electric power distribution company do Rio de Janeiro, Coordenador de Planejamento Estratégico do CEPED- Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da Bahia, Subsecretário de Energia do Estado da Bahia, Secretário do Planejamento de Salvador, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015), As Grandes Revoluções Científicas, Econômicas e Sociais que Mudaram o Mundo (Editora CRV, Curitiba, 2016), A Invenção de um novo Brasil (Editora CRV, Curitiba, 2017), Esquerda x Direita e a sua convergência (Associação Baiana de Imprensa, Salvador, 2018, em co-autoria), Como inventar o futuro para mudar o mundo (Editora CRV, Curitiba, 2019) e A humanidade ameaçada e as estratégias para sua sobrevivência (Editora Dialética, São Paulo, 2021). 

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Author: falcoforado

FERNANDO ANTONIO GONÇALVES ALCOFORADO, condecorado com a Medalha do Mérito da Engenharia do Sistema CONFEA/CREA, membro da Academia Baiana de Educação, da SBPC- Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e do IPB- Instituto Politécnico da Bahia, engenheiro pela Escola Politécnica da UFBA e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário (Engenharia, Economia e Administração) e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, foi Assessor do Vice-Presidente de Engenharia e Tecnologia da LIGHT S.A. Electric power distribution company do Rio de Janeiro, Coordenador de Planejamento Estratégico do CEPED- Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da Bahia, Subsecretário de Energia do Estado da Bahia, Secretário do Planejamento de Salvador, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015), As Grandes Revoluções Científicas, Econômicas e Sociais que Mudaram o Mundo (Editora CRV, Curitiba, 2016), A Invenção de um novo Brasil (Editora CRV, Curitiba, 2017), Esquerda x Direita e a sua convergência (Associação Baiana de Imprensa, Salvador, 2018, em co-autoria), Como inventar o futuro para mudar o mundo (Editora CRV, Curitiba, 2019), A humanidade ameaçada e as estratégias para sua sobrevivência (Editora Dialética, São Paulo, 2021), A escalada da ciência e da tecnologia ao longo da história e sua contribuição ao progresso e à sobrevivência da humanidade (Editora CRV, Curitiba, 2022), de capítulo do livro Flood Handbook (CRC Press, Boca Raton, Florida, United States, 2022), How to protect human beings from threats to their existence and avoid the extinction of humanity (Generis Publishing, Europe, Republic of Moldova, Chișinău, 2023) e A revolução da educação necessária ao Brasil na era contemporânea (Editora CRV, Curitiba, 2023).

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